Este livro é resultado direto de sua pesquisa: "O espaço acadêmico da pedagogia no Brasil: perspectiva histórica e teórica", desenvolvida pelo autor no período de setembro de 2002 a setembro de 2004, como subsídio à implantação do curso de pedagogia da FFCLRP-USP, que contou ainda com uma bolsa de produtividade pelo período de agosto de 2003 a fevereiro de 2007.
O livro é dividido em três partes, que são precedidas por um prefácio onde o autor traz informações mais precisas em relação ao contexto de produção da obra. Na introdução geral Saviani traz aspectos epistemológicos ligados ao uso do termo "Pedagogia" no cenário brasileiro, destacando as diferentes formas pelas quais a pedagogia foi definida ao longo da história. De acordo com ele:
Foi a partir do século XIX que tendeu a se generalizar a utilização do termo 'pedagogia' para designar a conexão entre a elaboração consciente da idéia de educação e o fazer consciente do processo educativo, o que ocorreu mais fortemente nas línguas germânicas e latinas do que nas línguas anglo-saxônicas. E esse fenômeno esteve fortemente associado ao problema da formação de professores (p. 6-7).
Na primeira parte do livro, nomeada como "Perspectiva Histórica", o autor detalha em 6 capítulos, o desenvolvimento do curso de Pedagogia no Brasil desde o aparecimento das primeiras universidades que surgiram após a aprovação do Estatuto das Universidades de 1931, este que foi elaborado por Francisco Campos, então ministro da Educação e Saúde Pública. No discorrer dos capítulos, ele destaca sobre isso, o surgimento dos cursos de Pedagogia na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo e o da Universidade do Distrito Federal (a UDF) que foi extinta em cerca de 4 anos depois 1939, com a criação da Universidade do Brasil (atual UFRJ) e a sua Faculdade Nacional de Filosofia, Ciências e Letras.
Saviani destaca as controversas discussões a cerca da implementação do curso de Pedagogia nessas universidades, a luta pela não extinção do curso de Pedagogia, e o papel das Escolas Normais, Escolas profissionalizantes , e também dos grandes nomes que lutaram pela implementação da Pedagogia no Brasil, entre eles, o saudoso Anísio Teixeira. O curso de Pedagogia enfrentou uma grande resistência durante longos períodos, a formação inicial para atuação na educação primaria era possível através das Escolas Normais, que desempenharam um papel notório naquela época, conforme o autor:
De fato, a organização do campo educacional implicava a profissionalização da atividade dos educadores, de modo geral, e dos professores, em particular. E a profissionalização, por sua vez, implicava uma formação específica, o que se iniciou no século XIX com as tentativas intermitentes de criação de Escolas Normais para a formação de professores primários as quais vieram a adquirir alguma estabilidade no século XX. Colocava-se, porém, a questão da formação dos professores das Escolas Normais e do ensino secundário em seu conjunto, o que acabou por provocar a exigência de se abrir espaço para os estudos pedagógicos em nível superior (p. 32).
Entretanto,
[…] a implantação da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras esbarrou na resistência das faculdades profissionalizantes que não aceitavam a centralização das disciplinas básicas na nova faculdade. Assim, a partir de 1938 também essa faculdade veio a tornar-se, como as demais, uma escola profissional com o objetivo de formar professores para o ramo secundário do ensino médio. É nesse contexto que, pelo Decreto Estadual n. 9.269, de 25 de junho de 1938, se extinguiu o Instituto de Educação, que foi absorvido pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras como seção de Educação (p. 29).
Dentre as diversas mudanças descritas pelo autor, chama-me atenção o antigo regime conhecido por "3+1". Durante os primeiros anos da implementação do curso superior para pedagogia, esse era dividido em duas modalidades, o bacharelado e a licenciatura. O curso no aspecto do bacharelado formava os estudantes para lidar com os processos burocráticos e administrativos da educação, como a direção e inspeção escolar. Enquanto o diploma de licenciatura era garantido para os que pretendiam atuar dentro das salas de aula, lecionando as disciplinas. Deste modo, o bacharelado em Pedagogia tinha duração de 3 anos, e aqueles que pretendiam obter o diploma de licenciado precisava estudar por mais 1 ano, cursando as disciplinas de didática. Esse modelo vigorou por longos anos no cenário brasileiro.
É também nesta parte do livro que o autor versa sobre as transformações causadas pela Lei nº 5.540/68, também conhecida como a "Lei da Reforma Universitária". Pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB) de 1971 (5.692/71), e pela nova LDB da educação nacional, aprovada em 1996, e em suas alterações mais recentes até o lançamento do livro (2005, 2007). Apesar de não ter uma nota referente a isso, gosto de salientar que a Lei nº 5.692/71 foi implementada duranet o período de ditadura militar no Brasil. Um aspecto observado é em relação a restrição dada pelo autor em seus estudos, apesar da sua análise restringir-se a universidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Brasilia, é válido destacar que, paralelamente ocorriam debates em outros estados do Brasil referentes ao mesmo assunto. Entranto, com sua eloquência e análise precisa, Saviani consegue dar conta de transmitir esse momentos históricos para o leitor com as bases que optou por usar em seu escrito.
Através dos histórico observado, de acordo com o autor,
[...]pode-se ver que, a partir da década de 1930, a pedagogia ocupou um espaço permanente na estrutura do ensino superior. Entretanto, com exceção do breve ensaio da Universidade do Distrito Federal, esse espaço limitou-se a prover disciplinas como garantia da formação de determinados profissionais da educação. Não se configurou, pois, como um espaço propriamente investigativo, o que resultou num ensino o mais das vezes precário do ponto de vista da qualificação que propiciava e pouco consistente pelo aspecto da sua fundamentação teórico-científica (p. 71).
Deste modo:
Parece, então, que o caminho para equacionar de modo adequado o problema do espaço acadêmico da pedagogia começa pelo resgate de sua longa e rica tradição teórica, explicitando, no conjunto de suas determinações, sua íntima relação com a educação enquanto prática da qual ela se origina e a qual se destina (p. 74).
Diante disso, inicia-se a segunda parte do livro, dividida também em 6 capítulos, como a primeira parte, nomeada por "Perspectiva Teórica", em que Saviani se debruçar a escrever sobre as teorias que envolvem a educação e sua prática, e que, posteriromente servem de base para o espaço acadêmico. Além disso, ele aproveita para sinstetizar nesses capítulos assuntos tratados em suas obras anteriores, enriquecendo ainda mais este trabalho. A partir daqui, o autor detalha os processos que originaram as tendências pedagogicas, trazendo aspectos que definem cada uma delas.
Seguindo o procedimento indicado, trata-se de começar o exame teórico da questão pela retomada das principais concepções de educação, as quais podem ser agrupadas em cinco grandes tendências: a concepção humanista tradicional, desdobrada em duas vertentes, a religiosa e a leiga; a concepção humanista moderna; a concepção analítica; a concepção crítico-reprodutivista; e a concepção dialética ou histórico-crítica. Conforme minha hipótese de trabalho, cada uma dessas concepções pode ser considerada segundo três níveis: a filosofia da educação, a teoria da educação ou pedagogia e a prática pedagógica, os quais, porém, têm pesos diferentes e se combinam diferentemente conforme variam as concepções (p. 77-78).
Pretendo apofundar sobre das tendências pedagógicas em um post separado futuramente, então não vou prolongar a discussão a cerca da segunda parte do livro hoje. Em um futuro próximo, vou falar sobre as tendências à visão deste outros autores brasileiros que trazem escritos sobre o tema.
Quanto a terceira parte do livro denominada "Glossário Pedagógico", o autor tratou de explicar em cerca de 45 pequenos verbetes as principais correntes pedagógicas brasileiras, com alguns detalhes sobre cada uma delas, oferecendo, desta forma, um rico material de consulta para quem pretende conhecer mais sobre o tema.
Assim, a obra oferece contribuições valiosas não apenas para o campo da pedagogia, mas também para as licenciaturas de modo geral. Torna-se um livro essencial para quem busca compreender a história do surgimento da Pedagogia no Brasil. Com uma narrativa envolvente e de fácil compreensão, a obra descreve de maneira precisa cada momento crucial que nos conduziu ao curso de Pedagogia que conhecemos hoje. Serve como um recurso fundamental para explorar a fundação do curso, seu caráter político-ideológico e os contextos históricos que o moldaram.
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Aqui você pode baixar o livro completo para ler, segredo nosso, não conta pra ninguém: A Pedagogia no Brasil: História e Teoria - Demerval Saviani
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